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A Prática Artística e os Direitos da Natureza

 

Cláudia Ormonde

FBAUP/AE Trofa

 

Diante da crise ambiental que vivemos, pode tornar-se a sala de aula de artes visuais um espaço de questionamento e resistência? Porquê incorporar, na docência, a prática artística como uma ferramenta que nos faz repensar a nossa relação com a natureza, especialmente no que toca aos impactos do extrativismo? A partir da expressão artística, como é que a arte pode dar voz à natureza, denunciar injustiças e inspirar novas formas de coexistência mais respeitosas e equilibradas?
Ao longo do meu percurso profissional como docente de Artes Visuais, arte-educadora inspirada nos princípios da Carta da Terra e o desafio vivenciado de abraçar a Arte com a Ciência, reconheci a importância de integrar questões ambientais e sociais na prática da educação artística. Vejo a Escola como um espaço chave para promover práticas pedagógicas que enfrentem desafios como o extrativismo, o colonialismo, o patriarcado e a branquitude, cujos efeitos influenciam as relações humanas e a conexão com a natureza. Motivada por uma educação mais inclusiva e crítica, sigo o objetivo de desenvolver práticas pedagógicas mais éticas, conscientes e comprometidas com a justiça social e ambiental. A proposta de comunicação que proponho à APECV é criar um espaço de consciencialização e reflexão, sobre as lentes que usamos na dinamização das práticas artísticas em contexto educativo e um convite à ação, através da partilha de alguns exemplos:
– A prática artística de Carolina Caycedo, presente na instalação Our Mineral Intensive Futures (Manifesta15, 2024), combina ética e estética ao criticar o extrativismo associado às chamadas “energias verdes/limpas”. A artista expõe como a exploração de minerais essenciais à transição energética — como cobre, lítio e cobalto — reproduz lógicas coloniais e capitalistas, especialmente no Sul Global, onde se concentra grande parte dessas reservas. A artista colombiana aborda o relatório do Banco Mundial Minerals for Climate Action: The Mineral Intensity of the Clean Energy Transition, que prevê um aumento de quase 500% na extração desses minerais até 2050, para investigar as implicações laborais, ambientais e geopolíticas dessa ação e questiona a sustentabilidade da chamada energia “limpa” quando guiada por modelos extrativistas. “Nossos futuros, hostis ou belos?” e “Re-existir para transicionar”- espaço de reflexão sobre a justiça ecossocial e a uma transição energética verdadeiramente justa.
– Na minha prática letiva incorporo as preocupações ambientais que me habitam e promovo uma reflexão conjunta com os diferentes públicos. Reflexão sobre – O que é a natureza para o humano? (Groot, 2021). A elegia da Terra é enunciada enquanto as pessoas nascerem, viverem e morrerem desconectadas, contudo embebidas nela, na natureza. A ação (in)consciente entre a relação da natureza com o ser humano remete ao contexto de destruição ambiental. A natureza vista como um recurso a ser explorado, uma entidade separada do humano, passível de domínio e transformação. Esse paradigma antropocêntrico contribuiu para processos destrutivos como as mudanças climáticas e a perda da biodiversidade. Segundo Gualinga (2023), “somos natureza”. Esta profunda conexão espiritual, cultural e prática que os povos indígenas têm com o meio ambiente, é uma realidade para a humanidade se relacionar com o planeta, baseando-se na ideia de coexistência e respeito mútuo.
Quem fala pela natureza? Segundo Stone (1972), à natureza poder-se-á dar-lhe voz e conferir-lhe legitimidade jurídica. Nos últimos anos, a noção de direitos da natureza tem ganho destaque no cenário mundial, refletindo uma mudança paradigmática na relação entre humanos e meio ambiente. Inspirado por cosmovisões indígenas e impulsionado por crises ambientais globais, esse conceito reconhece ecossistemas e seres naturais como sujeitos de direitos, capazes de existir, prosperar e se regenerar.
O exemplo da concessão de personalidade jurídica ao rio Whanganui, na Nova Zelândia, em 2017, representou um marco histórico na relação entre direito e natureza, tornando-se o primeiro caso mundial em que um recurso natural foi reconhecido legalmente como uma entidade com direitos próprios. Para o povo Māori, Whanganui, o rio não é apenas um curso de água, mas um ancestral vivo, essencial para a sua identidade cultural e espiritual.
Com os alunos do terceiro ciclo foram criadas ilustrações dos princípios enunciados na Carta da Terra e da história “Quem fala pela Árvore? (Groot, Earth Stories).
A construção de uma imagem sustentável não se limita apenas aos aspetos materiais ou técnicos da sua produção, mas também à sua imaterialidade, ao significado que contém e ao seu impacto na sociedade e no meio ambiente. Uma imagem sustentável é aquela que, na sua totalidade, contribui para a construção de um futuro mais justo, equilibrado e ecologicamente correto, responsável e conectado com a natureza.

Palavras-chave: Antropoceno, extrativismo, ecossistemas, neocolonialismo, direitos da natureza, imagem sustentável.

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